PRESTES - Ato nº5 - Luiz Paixão

PRESTES - Ato nº5 - Luiz Paixão

PRESTES - Líder do Levante Armado Antifascista de 1935 - obra de Carlos Scliar

PRESTES - Ato nº5

Dramaturgo Luiz Paixão

ABRE LUZ NA ASSEMBLÉIA DE FUNDAÇÃO DA ANL, NO TEATRO JOÃO CAETANO, RIO DE JANEIRO, MARÇO/35.

HERCOLINO CASCARDO - “A Aliança Nacional Libertadora vai esforçar-se, dentro da ordem e da Constituição vigente, pela difusão das idéias de seu programa... nossa necessidade mais urgente é a realização efetiva da independência econômica do povo brasileiro...”. “... a Aliança Nacional Libertadora nasce para lutar pela concretização real da democracia e de lutar dentro da Constituição e da ordem pela libertação nacional e social do povo brasileiro...” E para a sua presidência de honra foi proposto o nome do general Luiz Carlos Prestes, o Cavaleiro da Esperança!

POVO APLAUDE ENTUSIASTICAMENTE. FECHA A LUZ. ABRE NUMA REUNIÃO DO ESTADO MAIOR DA REVOLUÇÃO.

MIRANDA - Camaradas, o governo feudal-burguês de Vargas vai ruir. A Aliança Nacional Libertadora chegou a todos os pontos do Brasil. São mais de um milhão de filiados.

GHIOLDI - E desses mais de um milhão, quantos são operários?

MIRANDA - A cada dia três mil novas filiações. Uma realidade que não se pode mais negar.

BERGER - Miranda, você não respondeu a pergunta do camarada Ghioldi.

MIRANDA - São muitos os operários nas fileiras da Aliança. Como são muitos os militares e intelectuais.

BERGER - Os pequeno-burgueses são maioria e isso me preocupa.

MIRANDA - Não há com o que se preocupar, camarada.

BERGER - Será que eles aguentam uma contracorrente?

MIRANDA - A pequena-burguesia é “a força revolucionária da ANL”.

GHIOLDI – O camarada está negando a vanguarda revolucionária que é o operariado.

MIRANDA - Não foi isso que eu quis dizer, camarada. Se o dei a entender, faço minha autocrítica. Mas os camaradas não podem negar que há um descontentamento generalizado no seio da pequena burguesia.

GHIOLDI - Se o proletariado não tiver um papel preponderante, não vejo muito futuro na organização popular e na revolução.

MIRANDA - O futuro está nos mais de um milhão de filiados que todo dia põem Plínio Salgado e seu bando de galinhas-verdes para correr.

GHIOLDI - Só essas brigas de rua não farão a revolução triunfar.

MIRANDA - Mas o que está havendo? Agora estão todos contra mim?

GHIOLDI - Estamos a favor da revolução.

MIRANDA - Para estarem a favor da revolução se colocam contra mim?

GHIOLDI - Me desculpe, mas o camarada encara a revolução de forma voluntarista.

MIRANDA - Não sou o inimigo.

BERGER - Ninguém o acusou, Miranda.

MIRANDA - O inimigo está no Palácio do Catete e não no Comitê Central do Partido Comunista. A massa está na rua esperando para ouvir o manifesto do Prestes. Foi Getúlio que não permitiu a realização do nosso comício, mas ainda assim a massa foi para a rua e espera ansiosa. O que é isso? Isso é mobilização. É contra Vargas que você tem que lutar e não contra o Secretário Geral do Partido e membro do Estado Maior da Revolução.

Antonio Maciel Bonfim, o Miranda, secretário geral do Partido Comunista Brasileiro (PCB), 1935

PRESTES - (ENTRANDO) O que houve, camaradas?

BERGER - Não foi nada. O Miranda está nervoso.

PRESTES - Há três meses Getúlio editou a Lei de Segurança Nacional, hoje promovemos uma manifestação gigante. Alguma coisa está para acontecer. Temos que estar preparados para tudo e não podemos perder tempo em ficar nervosos. Eu quero saber como as coisas estão correndo, como as pessoas estão reagindo ao meu documento.

DURANTE A CENA A MULTIDÃO INVADIU O PALCO PARA A MANIFESTAÇÃO. OTÁVIO DA SILVEIRA, NO PALANQUE, LÊ O MANIFESTO DE PRESTES.

OTÁVIO - “... somos os herdeiros das melhores tradições revolucionárias do nosso povo e é recordando a memória de nossos heróis que marchamos para a luta e para a vitória! Brasileiros! Aproximam-se os dias decisivos! Os trabalhadores de todo Brasil demonstram, através de lutas sucessivas, que já não podem mais, nem querem mais se submeter ao governo em decomposição de Vargas e seus asseclas nos estados. A Aliança Nacional Libertadora já representa a enorme força revolucionaria do nosso povo e sua incomensurável vontade de sacrifício para a luta de libertação nacional do Brasil. Marchamos assim rapidamente, à implantação de um governo revolucionário em todo o Brasil. Brasileiros! Todos vós, que estais unidos pelo sofrimento e pela humilhação, em todo o Brasil! Organizai vosso ódio contra os dominadores, transformando-o na força irresistível e invencível da revolução brasileira! Vós que nada tende a perder e a riqueza imensa de todo o Brasil a ganhar! Arrancai o Brasil das garras do imperialismo e de seus lacaios! Todos à luta pela Libertação Nacional do Brasil! Abaixo o fascismo! Abaixo o governo odioso de Vargas! Por um governo nacional revolucionário! Todo o poder à Aliança Nacional Libertadora! - Luiz Carlos Prestes”.

OLGA - Eu sei que não devo me intrometer nos assuntos internos do Partido, mas...

PRESTES - O que foi?

OLGA - Eu não gosto do Miranda.

PRESTES - Por que?

OLGA - Não sei, Carlos, não gosto. Não confio nele. O Ghioldi também não gosta, acha que é um semianalfabeto, sem nenhum preparo político.

PRESTES - Miranda é um falastrão, nada mais.

OLGA - Eu não entendo como uma pessoa dessas consegue ser Secretário Geral do Partido.

PRESTES - Parece que sua ascensão foi meteórica. Em menos de dois anos de militância atingiu o cargo máximo.

OLGA - Você não acha estranho?

PRESTES - Eu vou procurar saber, mas não posso prometer muito. Sem poder sair, sem poder conversar com ninguém, fica difícil...

OLGA - Conversa com o Ghioldi e com o Berger sobre isso.

PRESTES - Claro... Vai sair com Sabo?

OLGA - Ela ficou de passar aqui. Vamos ao teatro. Sabo só tem a mim, Carlos. Distante do seu país...

PRESTES - Você também está longe da Alemanha.

OLGA - Mas eu tenho você. (SE BEIJAM) Me promete uma coisa?

PRESTES - Tudo que você quiser.

OLGA - Eu quero conhecer o Brasil, Carlos. Cada cantinho mais escondido. Conhecer sua gente, seus lugares, sua cultura. Sabe aquele lugarejo que não consta nos mapas? Eu quero ir lá. E quero também chupar manga, muita manga...  Me lambuzar toda. Adoro manga, é a fruta mais gostosa que já experimentei em toda a minha vida. Manga não existe, é um sonho. Escorregando entre os seus dedos, sujando sua roupa. Manga devia existir em todos os países, para que todo o mundo soubesse o que é o prazer de se chupar manga. Eu quero conhecer o Brasil. Vocês gostam tanto daqui... se orgulham tanto. Na Alemanha não conhecemos a necessidade de falar do nosso amor pela pátria, assim como vocês brasileiros falam. Pátria para nós, era sinônimo de fascismo. Pátria não estava em nosso coração como o Brasil está no de vocês. Pátria significava guerra e ocupação, miséria e terror.

PRESTES - Um dia, Olga, tudo isso vai mudar. Aí, então, todos nós, em todas as partes do mundo, viveremos melhor. Sem miséria, sem guerra, sem ocupação e sem terror. Um dia, talvez, a gente possa plantar um pé de manga em cada país...

A LUZ CAI SOBRE OS DOIS. ABRE LUZ GERAL. O PALCO É INVADIDO POR REVOLUCIONÁRIOS ALIANCISTAS. ARMAS NAS MÃOS. VITORIOSOS. ELES CANTAM O “HINO DA ANL”, COM MÚSICA DO “HINO DA INDEPENDÊNCIA”.

Nosso povo que vive oprimido

Já não pode sofrer tanta dor

É preciso fazer do gemido

Uma voz de esperança e de amor;

Nosso peito há de ser a muralha

Contra quem explorar a Nação.

Esse povo que vive e trabalha

Quer Justiça, quer Terra , quer Pão!

 

Aliança! Aliança!

Contra vinte ou contra mil!

Mostremos nossa pujança!

Libertemos o Brasil!(74A)

OS REBELDES CONTINUAM EM CENA. LUZ BAIXA NELES. ABRE EM REUNIÃO DO ESTADO MAIOR.

MIRANDA - Eles precipitaram tudo! Não houve ordem da direção do Partido para o levante.

PRESTES - Não temos mais que discutir se os companheiros erraram ou não. Se anteciparam o movimento espontaneamente, está antecipado. Resta saber o que vamos fazer.

GHIOLDI - Não podemos cometer a loucura de levantar o Rio.

PRESTES - O que não podemos é abandonar os companheiros de Natal e Pernambuco.

MIRANDA - Proponho a convocação de uma greve geral em apoio aos companheiros rebelados. Além disso, temos sim que preparar a insurreição para tomar o Palácio do Catete.

Arthur Ernest Ewert, codinome Harry Berger

BERGER - Temos poucos dias para a preparação de um movimento desse porte.

GHIOLDI - Eu voto contra a insurreição e contra a greve geral.

BERGER - Vargas acabou de decretar o Estado de Sítio. Tentar uma insurreição agora só poderá levar ao massacre das forças revolucionárias.

MIRANDA - A massa vai para a rua em nosso apoio.

GHIOLDI - Não temos condição para realizar nem uma coisa nem outra.

BERGER - Eu voto com o Índio. Tentar uma insurreição agora é suicídio

MIRANDA - Os operários vão seguir o Partido... Eu garanto.

BERGER - Nosso trabalho de massa é primitivo, Miranda. Não podemos contar com o espontaneísmo e sua vontade de luta. E, além disso, temos poucos dias para preparar o movimento.

PRESTES - Os companheiros de Natal instauraram um governo popular e revolucionário. Estão resistindo bravamente. Em Pernambuco, pelo pouco que se sabe, estão resistindo também. O Gregório Bezerra...

GHIOLDI - Isso não quer dizer que devemos sair atirando feito um bando de malucos, numa ação suicida.

PRESTES - Não podemos abandoná-los. Então, vamos nós, o comando revolucionário ficar de observadores enquanto a revolução acontece?

GHIOLDI - Não temos nenhum apoio.

PRESTES - A Vila Militar, a Escola Militar e a Escola de Aviação estão dispostas à insurreição.

MIRANDA - Informo aos camaradas que os postes da Light estão todos minados, assim que o levante for deflagrado, eles voam pelos ares.

BERGER - Camaradas, a avaliação do Índio é correta: não temos condições objetivas nem subjetivas para o levante. Nosso movimento está fragilizado, débil. A correlação de forças é completamente desfavorável a nós.

GHIOLDI - Tenho tido contato com companheiros e sei que tudo isso que o Miranda diz só existe no papel.

PRESTES - A Marinha de Guerra está comprometida conosco e se fizermos o levante ela toma o poder ao nosso lado.

GHIOLDI - O que você falou?

PRESTES - A Marinha de Guerra está comprometida comigo para tomar o poder.

GHIOLDI - Se é assim, que se faça a insurreição.

BERGER - É só marcar a data.

PRESTES - Madrugada do dia 26 para 27. Vamos redigir o manifesto. Que Victor ligue o seu rádio e fale com Moscou, anunciando a revolução.

FECHA A LUZ NELES. SOBE A LUZ DOS REBELDES. ELES CANTAM “HINO DO BRASILEIRO POBRE”, COM MÚSICA DO “HINO NACIONAL BRASILEIRO”.

Do norte das florestas amazônicas

Ao sul onde a coxilha a vista encanta

A terra brasileira à luz dos trópicos

É como um coração que bate e canta

 

Operários, camponeses

Estudantes, funcionários, pés rapados

Já sofremos, mil reveses

Já cansamos desta vida de explorados

 

Punhos cerrados

Levantados

Protestemos!

 

Brasil terra do lenho cor de púrpura

Que logo coloriu nossas bandeiras

Teu nome é só por si vermelha flâmula

Vermelhas são as almas brasileiras!

 

De pé formosa e brava mocidade

De clara inteligência e fortes músculos,

Lutemos por Pão, Terra e Liberdade

 

Vem camarada libertador,

Para o fragor das barricadas

O verbo, o canto, o braço, o fuzil

Pelo nosso Brasil!

VOLTA A ABRIR NO APARELHO. OLGA ENTRA CORRENDO.

OLGA - Sabo e Arthur acabam de ser presos.

PRESTES - Não é possível!

OLGA - A polícia está na casa deles. Eu os vi sendo arrastados.

PRESTES - Alguém os denunciou.

OLGA - Temos que sair logo daqui.

PRESTES - E se alguém os denunciou, a polícia pode estar vindo para cá.

OLGA - E para onde vamos?

PRESTES - Victor. Vamos para o apartamento dele. De lá entramos em contato com o Partido para arranjar outro aparelho.

OLGA - Será que vão torturar Arthur e Sabo?

PRESTES - A revolução não está perdida, Olga. O governo sabe que o povo vai resistir ao avanço do fascismo.

OLGA - Talvez não sejam torturados, quem sabe a polícia... sendo os dois estrangeiros.

PRESTES - Eu quero que você me prometa uma coisa.

OLGA - O que?

PRESTES - Se eu for preso você não vai se deixar entregar, vai continuar nossa luta.

OLGA - Se você for preso, Carlos, eu não escapo. Mas ninguém vai chegar perto de você...   

PRESTES - Filinto Müller... ele jamais esqueceu... e agora é o seu momento...

OLGA - A Coluna? Tanto tempo já...

PRESTES - Ele não esqueceu.

OLGA - Ele não vai te encontrar.

PRESTES - Claro que não. A classe operária precisa de nós, nós vamos conseguir.

OLGA - Sabo é tão terna, Carlos. Ela e Arthur se amavam tanto.

PRESTES - Se amam!

OLGA - Claro... Os documentos?

PRESTES - Tudo no cofre. Gruber fez um bom trabalho. Se a polícia tentar arrombá-lo, vai tudo pelos ares. (82) Vamos embora.

OLGA - Carlos, será que eles vão resistir?

PRESTES - Eles são comunistas!...

OS DOIS SAEM. FECHA LUZ. VOLTA A ABRIR. BERGER EM CENA. ROTO, EM FRANGALHOS. FOI BARBARAMENTE TORTURADO. TORTURADORES O CERCAM, TODOS ARMADOS. SEU ROSTO ESTÁ COMPLETAMENTE DESFIGURADO PELOS HEMATOMAS. UMA MÚSICA SUBLINHA A CENA, TALVEZ “BACHIANAS N.5”, DE VILLA LOBOS. SABO SURGE EM CENA, COMO QUE EMPURRADA VIOLENTAMENTE. ELA CAI. SEU CORPO TAMBÉM ESTÁ COBERTO DE CHAGAS. ROUPA RASGADA. SEMI-NUA.

TORTURADOR 1 - Levanta, puta!

ELE DÁ UM CHUTE NELA. OS OUTROS TORTURADORES RIEM. ELA SE ESFORÇA PARA LEVANTAR-SE. COM DIFICULDADE RECONHECE O MARIDO DESFIGURADO.

SABO - Arthur?...

BERGER - Sou eu...

TORTURADOR 2 - Cala a boca, comunista filho da puta. (DÁ UMA PORRADA)

TORTURADOR 3 - Cadê o Prestes?

TORTURADOR 1 - Puta, cadê o Prestes?

TORTURADOR 3 - O Miranda abriu o bico. Já sabemos de tudo. Só queremos o Prestes. Onde é o aparelho?

BERGER NÃO RESPONDE. O TORTURADOR 3 DÁ UMA PORRADA NELE.

TORTURADOR 2 - Se vocês falarem serão bem tratados, assim como o Miranda. Ele não apanha mais. Onde é o aparelho do Prestes?

TORTURADOR 1 - Temos os documentos que estavam no cofre. Já sabemos de tudo. A bomba não explodiu.

TORTURADOR  3 - Fala comunista filho da puta! Sua mulher também vai levar porrada.

TORTURADOR 3 DÁ UMA PORRADA EM SABO, ELA CAI.  TORTURADOR 2 PEGA UMA ENXADA E JOGA NELA.

TORTURADOR 2 - Pega, sua vaca filha da puta. Comece a cavar. Vocês dois vão morrer. Pode começar a cavar a sepultura.

TORTURADOR 1 - Você quer morrer, puta? Então fale onde está o Garoto. Garoto é o Prestes, não é? Estão vendo como sabemos de tudo? Índio é o Ghioldi e Negro é você, seu alemão filho da puta!

TORTURADOR 3 - Sabemos de tudo. Ghioldi caiu, Miranda caiu, você caiu. Agora eu quero saber do Prestes. Ele vai cair também. Nós já sabemos de tudo.

TORTURADOR 2 - Ele vai morrer primeiro, puta. Comece a cavar.

OS TORTURADORES FORMAM O PELOTÃO DE FUZILAMENTO. APONTAM PARA BERGER. UM TEMPO. NENHUMA REAÇÃO DE BERGER OU SABO, QUE APENAS SE OLHAM, SOLIDÁRIOS. O TORTURADOR 3, PUTO, RASGA O QUE RESTA DA ROUPA DE SABO, DEIXANDO-A COMPLETAMENTE NUA, CAÍDA NO CHÃO.

TORTURADOR 3 - Ela é de vocês...

TORTURADOR UM DESCE AS CALÇAS, OS OUTROS SEGURAM SABO. FEITO UM ANIMAL O TORTURADOR 1 ESTUPRA SABO, SOB O RISO DOENTIO DOS OUTROS. BERGER APENAS OLHA. A LUZ FICA EM RESISTÊNCIA ENQUANTO OUTRAS CENAS DE TORTURA COMPÕEM O QUADRO MEIO APOCALÍPTICO DA REPRESSÃO POLÍTICA. UM FOCO EM OLGA E PRESTES, NO APARELHO.

OLGA - Torturaram muito Sabo e Arthur...

PRESTES - Eles nunca vão falar.

OLGA - Vamos sair do país, Carlos. A polícia está muito próxima de nós. Essa região está sendo toda vasculhada, casa-a-casa, palmo-por-palmo.

PRESTES - A revolução precisa de mim, Olga. Eu não posso abandonar tudo agora, não posso...

OLGA - Será que ainda podemos fazer alguma coisa aqui? É útil para a classe operária, para a revolução, continuarmos aqui? Será que não é o momento de sairmos para voltar mais organizados, mais fortes?

PRESTES - Amanhã vamos para outro aparelho. Não vão nos encontrar. Estaremos em segurança.

OLGA - Eu tenho medo.

PRESTES - Fique calma.

OLGA - Não quero me separar de você.

PRESTES - Isso não vai acontecer. Amanhã...

OS DOIS SE ABRAÇAM COMO QUE PEDINDO PROTEÇÃO UM AO OUTRO. SE ACARINHAM. “LUA BRANCA” SE FAZ OUVIR, AO LONGE. OLGA ESCUTA.

OLGA - Essa música... tão bonita...

PRESTES - Foi composta por uma grande mulher: Chiquinha Gonzaga...

OLGA - Triste...

PRESTES - Chiquinha Gonzaga rompeu com os padrões de sua época...

OLGA - ... tão bonita...

PRESTES - Uma revolucionária... a música chama-se “Lua Branca”... fala da separação de dois amantes... ela o abandonou e ele se queixa à lua...

OLGA - Que engraçado... hoje não tem lua...

PRESTES - Tem, sim, Olga... atrás das nuvens... por cima da chuva... ela brilha... apesar de tudo, ela brilha...

Jornal "O Globo" comemorando a prisão dos revolucionários

PALCO É SUBITAMENTE INVADIDO POR POLICIAIS ARMADOS, APONTANDO SUAS ARMAS PARA PRESTES. OLGA INSTINTIVAMENTE SALTA À SUA FRENTE, COLOCANDO-SE COMO ESCUDO PARA PROTEGÊ-LO. FOI TUDO MUITO RÁPIDO.

OLGA - Não atirem! Ele está desarmado!

OS POLICIAIS SE OLHAM ATÔNITOS, SEM SABER O QUE FAZER.

OLGA - Ele está desarmado!...

Jornal "O Imparcial" com informações sobre a prisão de Prestes e Olga

NOS VÁRIOS PONTOS DO PALCO AS TORTURAS CONTINUAM. OS TORTURADORES CORTAM OS SEIOS DE SABO COM UMA NAVALHA. OLGA, PRESTES E OS POLICIAIS PARALIZARAM SEUS MOVIMENTOS. A LUZ VAI CAINDO LENTAMENTE. “LUA BRANCA”, INSTRUMENTAL, ENCHE O TEATRO. O BLACK-OUT ENCERRA O PRIMEIRO ATO.

Recomendação da Aliança Nacional Libertadora (ALN) aos membros da organização, 1935

Luiz Paixão é diretor de teatro, dramaturgo, poeta e escritor

Venha Catetear!

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