Visita ao bairro Casa Amarela do Recife

Visita ao bairro Casa Amarela do Recife

Mercado Popular de Casa Amarela, década de 1930

Visita ao bairro Casa Amarela do Recife

Por Luiz Carlos Prestes Filho*

Certa vez, eu estava com a mamãe no Recife, onde fomos lançar o livro "Meu Companheiro - 40 anos ao lado de Luiz Carlos Prestes". Resolvemos caminhar pelo bairro Casa Amarela, onde ela nasceu e passou a primeira infância. Época quando minha mãe Maria era a menina chamada Altamira ou carinhosamente Mira. Dedicamos algumas horas a essa visita sentimental.

A Casa Amarela que deu origem a denominação do bairro do Recife

Ela lembrava de vários locais, até mesmo da Casa Amarela, que deu nome ao bairro. Apesar da mesma ser hoje um estabelecimento comercial e ter a fachada desfigurada, mamãe afirmou: "É essa casa sim! Eu lembro".

Foi divertido andar com ela pelo Mercado Popular, que tem uma estrutura de metal bonita. Mamãe lembrou: "Meu pai falou que esse mercado nasceu no mesmo ano que eu nasci, em 1930. Um dia, eu vou embora e esse lugar vai continuar a ficar assim, sempre cheio de gente".

Interior do Mercado Popular de Casa Amarela, Recife, Pernambuco

É claro que ela foi de barraca em barraca. Procurou todas as frutas do Nordeste, em especial aquelas que não conseguia comprar no Rio. Conversou com um vendedor de redes. Queria comprar uma para levar para Saquarema, mas achou o preço caro. Levou somente alguns artesanatos e um vestido de caipira para minha filha.

Quando saímos do mercado, ela olhou ao seu redor e apontou por onde passava a linha antiga do bonde. Disse que a confusão dos carros e dos ônibus de hoje fazem contraste com as ruas tranquilas de quando era garota.

Bonde da linha Casa Amarela, década de 1930

Paramos junto a um camelô que tinha uns banquinhos, pedimos água. Nesse momento, senti sua felicidade de estar no meio de uma multidão de gente humilde que passava de roupa surrada, de chinelo ‒ ainda que misturados ali houvesse alguns bêbados que pediam esmola e vira-latas imundos.

Naquele momento, senti que minha mãe procurava algo. Não deu outra. Certeira, ela descobriu onde estava o apontador do Jogo do Bicho. Claro, fez sua fezinha. Lembrei a ela que, caso ganhasse, não teríamos tempo de voltar para retirar o prêmio, ela respondeu: "Deixa que eu me viro".

Hoje, após sua partida, gostaria de dizer que para mim foram muito importantes aquelas horas, pois pude viver o amor dela pelo local de onde ela partiu para a aventura da vida. O bairro Casa Amarela foi o ponto de partida. Depois viriam São Paulo, Rio de Janeiro, Moscou, Kiev, Baku, Sochi, Surrúmi, Zelenográd, Berlim, Paris, Lisboa, Roma, Milão, Sófia, Budapeste, Bucareste, Maputo, Luanda, Havana, Buenos Aires, Montevidéo, Lima, Manágua, México e Saquarema. Sim, a querida cidade de Saquarema, que ela dizia fazer lembrar da simplicidade do seu bairro de Casa Amarela.

Maria Prestes com o pai, João Rodrigues Sobral,e os irmãos Reginaldo (em pé) e Didier (sentado)

Antes de concluir esta rememoração, não posso esquecer de contar que a mamãe ganhou um bom dinheiro com a aposta que fez no Jogo do Bicho junto ao Mercado Popular. O mais interessante foi ver o rapaz da recepção do hotel onde estávamos hospedados entregar para ela o pacote com o dinheiro.

Distraído, não percebi que ela combinou dele ir até o apontador e retirar o prêmio: "Carlinhos, você sempre vê dificuldades para resolver as coisas. Como, antes da gente sair para passear, ele me contou que morava perto do mercado da Casa Amarela, combinei tudo com ele. Inclusive, ganhei mais dinheiro com a aposta no Jogo do Bicho do que com a venda do livro com as minhas memórias que viemos lançar".

Recomendamos a leitura do livro "Meu Companheiro - 40 anos ao lado de Luiz Carlos Prestes"

Editoras: E-Papers e Anita Garibaldi

Luiz Carlos Prestes Filho é filho de Maria do Carmo Ribeiro, conhecida como Maria Prestes, e de Luiz Carlos Prestes. Dona Maria foi batizada com o nome de Altamira Rodrigues Sobral, no bairro Casa Amarela da cidade do Recife, Pernambuco. Foi obrigada a mudar de identidade por conta da militância clandestina no Partido Comunista Brasileiro (PCB). Foi companheira de vida e luta do Cavaleiro da Esperança durante 40 anos.