MEU QUINTAL
MEU QUINTAL
Por Márcia Gomes
O meu interior é essa cidade
A cidade onde eu nasci
Uma cidade do interior
Minha felicidade é a vida que levei aqui
Meu quintal era o mundo
Meu jardim era flor de goiabeira
Meu espaço era o silêncio daqui
Não tenho lembrança da casa onde eu nasci
Uma casa velha na descida da Matriz
Só sei que era assim...
Paredes desenhadas de rachaduras
O chão batido de terra molhada
As janelas se descolavam abrindo fissuras
Deixando uma fresta de sol e luz nascer
Tive coragem de nascer aqui
Sei muito bem do sonho sonhado ali
Naquele silêncio e naquela arruaça
Gritos de independência e de denúncia
De onde se traspassava, às escondidas, para a capela ao lado
De onde se avistava a liberdade
Mesmo tarde, mesmo velada
Nasci aqui para ver a Serra
Para atravessá-la e para amá-la
Para andar descalça depois da chuva
Olhando o encanto de suas casas
Paredes caiadas em tantos tons, as janelas e trincos
Enfileiradas nas ruas tortas e na Direita
E ainda restam sobrados alardeando o passado
Becos que me levavam mais rápido
À rua de baixo ou até à de cima
Tanto faz...
Só queria olhar a Matriz
A Matriz que lá de cima fita as capelas
E as capelas, na singeleza de seus encantos
Glorificam a Matriz mesmo sem serem olhadas
Peço mais coragem para sair daqui
Uma cidade encantada
Onde nada é passado, é só história
Sinto-me inocente e pura
Me desprendo de andanças desastrosas
Que maculam meus olhos e deixam meus pés doendo
Nunca irei me esquecer daqui...
Tiradentes, 20 de dezembro de 2021
Márcia Gomes, poeta tiradentina
Aquarelas: Luiz da Pedra